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A pecuária de corte é um dos setores do agro que mais cresce na atualidade, sendo imprescindível para a economia nacional e mundial. Por trás dos empregos, tecnologias, pesquisas e alimento que esse grande setor do agro gera, existe um pecuarista preocupado, antenado e disposto a crescer junto a sua empresa. São diversos os gargalos que podem ocasionar o escoamento do lucro das corporações que englobam a pecuária, e um dos mais temidos, são as perdas aceleradas e imprevisíveis de animais. Mortes súbitas e aparentemente inexplicáveis do gado são casos recorrentes observados nas fazendas, que além de provocar prejuízos econômicos podem ser danosos a todo o rebanho. Algumas causas mais comuns de mortes súbitas são amplamente conhecidas e estudadas.
Plantas tóxicas: A intoxicação por plantas, junto com raiva e botulismo, são a causa principal de morte em bovinos adultos no Brasil. Estimativas indicam que cerca de um milhão de cabeças de gado morrem anualmente devido à ingestão dessas espécies venenosas. Atualmente, há 75 plantas de toxicidade conhecida e importância prática na pecuária, algumas são caracterizadas por plantas forrageiras que podem se tornar tóxicas sob certas condições.
A popularmente conhecida cafezinho, planta tóxica. Fonte: http://paulicoureamarcgravii.blogspot.com/2015/03/palicourea-marcgravii.html
Uma das plantas de destaque em casos de morte súbita, é a Palicourea marcgravii, conhecida popularmente por cafezinho. Sua ação brutal, dá-se pela boa palatabilidade e alta toxidez, além da extensa destruição geográfica, responsável por 80% das mortes por intoxicação de gado na região amazônica. A Arrabidae bilabiata, a “gibata”, também possui relevância como causa de morte súbita nessa região, no estado do Pará, Roraima e Acre. Já a Mascagnia rigida (Juss.) Griseb., nome popular timbó, é a planta tóxica de ação aguda mais importante nos estados do Nordeste, Minais Geras e Espírito Santo. As plantas do gênero Manihot, que incluem espécies silvestres de maniçoba, mandioca, pessegueiro-bravo (Prunus sphaerocarpa) e o Sorghum spp, também se destacam. A morte dos animais que as ingerem é aguda, devido à ação de inibição da respiração celular. Bovinos intoxicados são comumente encontrados mortos no pasto ou em estado de agonia, com sinais clínicos neurológicos (movimento de pedalagem e convulsão) e caídos a campo, em decúbito lateral. A prevenção de casos como esse consiste em manejo da pastagem para eliminação dessas espécies e boa alimentação do rebanho.
Botulismo: A intoxicação botulínica na pecuária é relacionada principalmente à ingestão de restos mortais de outros animais ou por contaminação da água. A morte pode se consumar dentro de 24 horas após a contaminação, variando conforme a quantidade de toxina ingerida, com letalidade de até 100%. Os sinais clínicos mais relevantes são dificuldade de locomoção e salivação excessiva. A prevenção desses casos ocorre através de manejo nutricional correto, descarte correto de carcaças animais e por aplicação de vacina disponível comercialmente.
Morcego, o transmissor da Raiva. Fonte: http://www.mt.gov.br/
Raiva: Bovinos infectados pelo vírus da raiva apresentam, geralmente, a forma paralítica da doença. Os animais infectados possuem dificuldade para urinar e defecar, sinais de engasgamento, paralisia principalmente das patas traseiras, movimentos de pedalagem, decúbito e por fim, morte. A prevenção dessa doença é a vacinação de todo o rebanho, ressaltando-se que a raiva é uma enfermidade de notificação compulsória, portanto, caberá sanção legal ao proprietário que não cumprir com esta obrigatoriedade.
Intoxicação por ureia e nitrato: A suplementação com ureia é comum na alimentação de ruminantes, porém, deve-se fazer o manejo nutricional adequado, com inclusão ideal desse aditivo. Animais que nunca consumiram e não são adaptados a esse composto nitrogenado, podem apresentar sinais clínicos graves e fatais, evoluindo para morte rapidamente. Observa-se agitação, desidratação, salivação excessiva e respiração ofegante, evoluindo para morte de 20 a 60 minutos após a ingestão, variando conforme a quantidade ingerida. Como prevenção a esse quadro, recomenda-se a utilização da ureia em uma taxa inferior a 2-3% da quantidade de concentrado ofertada, limitando- -se a 1% da dieta total. Já a intoxicação por nitrato pode ocorrer com a adubação excessiva e acúmulo dessa substância no solo absorvidas posteriormente pelas plantas as quais são ingeridas pelo animal, ocasionando sintomatologia similar à intoxicação pela ureia.
Choque séptico: ocorre através de infecções bacterianas severas, como mastites, metrites e peritonites ou quando a parede intestinal é afetada por trauma ou inflamações. Os sinais clínicos são hipertermia e fraqueza nas fases iniciais, evoluindo para mucosas roxas e dificuldade respiratória, ocasionando a morte rapidamente. A prevenção dá-se por tratamento adequado em casos de infecção.
Babesiose cerebral, transmitida pelo carrapato. Fonte: https://chemitec.com.br/
Choque hipovolêmico: ocorre quando há diminuição do volume sanguíneo circulante devido à perda de sangue por hemorragias severas, ou perda de fluídos secundário a diarreias graves. Doenças como babesiose cerebral ou tristeza parasitaria são causas infecciosas desse tipo de choque. Os sinais clínicos observados são anemia, apatia, decúbito e depressão. Em casos de infecção grave, a morte ocorre de forma súbita. A prevenção para essas doenças é o manejo correto e eliminação do principal vetor transmissor da doença: o carrapato.
Timpanismo espumoso: bovinos alimentados com dieta excedente em grãos e deficiente em fibras podem apresentar aumento na tensão do líquido ruminal superficial, o que ocasiona a impossibilidade de expulsão dos gases produzidos no rúmen. Dependendo da gravidade do caso, a morte ocorre dentro de 24 horas após a alimentação. Os sinais clínicos são de dor e distensão abdominal, dificuldade respiratória, decúbito e morte. A prevenção se dá através de manejo nutricional correto, com níveis adequados de fibra e carboidratos.
Descarga elétrica: esse tipo de evento pode ser chamado também de morte por fulguração e são causados por raios, instalações inadequadas de cercas elétricas, ou por queda de fios de alta tensão. Os animais morrem instantaneamente na maioria dos casos e os raros sobreviventes podem apresentar sequelas no sistema nervoso. Geralmente, os cadáveres são encontrados próximos a árvores ou cercas.
Ressalta-se a importância do médico veterinário no diagnóstico e prevenção das doenças e sinais clínicos citados.
Referências
Radostitis, O.M., Gay, C.C., Blood, D.C., Hinchcliff, K.W. Clínica Veterinária. Guanabara Koogan, 9 ed. p.1364-1380, 2002
Riet-Correa F. & Medeiros R.M.T. 2001. Intoxicações por plantas em ruminantes no Brasil e no Uruguai: importância econômica, controle e riscos para a saúde pública. Pesq. Vet. Bras. 21(1):38-42.
Tokarnia C.H., Döbereiner J. & Freitas M. 1979. Plantas Tóxicas da Amazônia a Bovinos e outros Herbívoros. INPA, Manaus.
Tokarnia C.H., Döbereiner J. & Peixoto P.V. Poisonous plants affecting livestock in Brazil. Toxicon 40 (2002) 1635–1660